Jornal UNI-BH

Thursday, September 29, 2005

Várias formas de se abordar a natureza

Artistas plásticos retratam o meio ambiente em suas mais variadas configurações e possibilidades

Júnia Leticia

Neste ano, em que é realizada em Johannesburgo (África do Sul) a Rio+10 – Conferência da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável –, artistas plásticos mostram que a conscientização ambiental já faz parte de seus trabalhos. Ricardo Assis, Hebert Dias de Oliveira e Miguel Gomez Martin: cada um, a seu modo, tiram da natureza a motivação e as matérias-primas para suas obras, de forma sustentável.

Mais conhecido como Stu, o produtor de eventos de música eletrônica Ricardo Assis trabalha a fibra natural, obtida do tronco da bananeira, como base para seus trabalhos. Para se transformar em tela, a fibra de banana e o bagaço de cana são processados artesanalmente pelo artista. Stu corta o tronco da fruta, depois que já saíram os cachos. Então, ele tira o miolo, pica em pedaços bem pequenos, leva para cozinhar de seis a oito horas e deixa esfriar de um dia para o outro, na mesma água em que o miolo foi cozido. No dia seguinte, a fibra, após ser amassada com as mãos e estendida sobre um tecido resistente, se transforma na tela.

Stu também utiliza o bagaço de cana em suas obras: “quando quero fazer uma tela mais ‘grosseira’, uso a cana. Corto o vegetal, da mesma forma que cortei a banana, e coloco para cozinhar, três horas depois que o tronco da fruto já estiver no fogo”, explica. Autodidata, na pintura, o artista utiliza tinta acrílica, privilegiando as formas abstratas e a naturezas mortas. Sem misturar água, Stu joga a tinta direto na tela. Por ser um trabalho natural, para finalizar, ele aplica selador e verniz nitrocelulose, para preservar a fibra.

Já Hebert Dias de Oliveira, o Tico, utiliza-se do jornal para desenvolver sua arte. De quadros a peças do vestuário, passando por móveis e utilidades domésticas, Tico faz do que muitos jogam fora a matéria-prima de suas obras. Vendedor de coco na orla da Lagoa da Pampulha, o artista teve seu trabalho descoberto pelo já falecido jornalista Wilson Frade.

Também autodidata, Tico começou a desenvolver seu trabalho para ajudar no orçamento doméstico. “Como possuo uma boa visão da Igrejinha da Pampulha, desenhei-a e comecei a trabalhar com o papel jornal. Ao lado de onde trabalho, morava o jornalista Wilson Frade, que, quando recebeu meu quadro de presente, elogiou-me em sua coluna. Fiquei meio desorientado com aquilo, porque o que eu fazia era uma coisa tão simples... Aí percebi que tinha possibilidade de melhorar alguma coisa e aprimorei meus trabalhos”, conta.

Apoiado por outros artistas, como Yara Tupynambá e Manoel Serpa, Tico conta que, apesar de vender poucas obras, seu trabalho está tendo boa aceitação. Graças a isso, ele conseguiu um patrocínio para a realização de mais obras, só que o projeto que apresentou na Secretaria Estadual de Cultura foi reprovado. “Agora, minha esperança maior é que eu ganhe um patrocínio simples, para ter material de trabalho. Porque a partir daí vou poder desenvolver com mais rapidez e clareza minhas obras”, ressalta.

Diferentemente de Tico e Stu, o Padre Miguel Gomez Martin retrata a natureza da forma que ela lhe vem pelo inconsciente. “Muitas pessoas falam que encontram em minhas obras uma dimensão de paz. Não sei. Procuro, logicamente, ir ao encontro daquilo que sinto e vejo. Em minhas telas, há muitas paisagens e céus. Por isso, a religiosidade está presente em meu trabalho, pois Deus está na natureza”, reflete.

Segundo Miguel Gomez, os céus são pintados por ele de uma forma não acadêmica, não realista, pois possuem sua interpretação. “Por isso, pode haver um céu pegando fogo, porque tudo depende do que estou sentindo, de uma forma inconsciente. Procuro não ser reflexivo no trabalho, porque sou perfeccionista. Pinto mais como uma forma de me expressar. Porque do contrário, nunca terminaria um quadro”, avalia.

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